Coisas das pessoas - um homem do seu tamanho
Ele passava os dias assim. Caminhava contra o sol e agradecia quando algum automobilista o deixava passar na passadeira.
Usava as mãos e os nós dos dedos para perceber que tipo de som saia do corrimão metálico ou da parede revestida a madeira; enquanto caminhava para outros afins e afãs.
Gostava de ajudar; especialmente com palavras. Não lhe era difícil usar as palavras. Frequentemente assentava ideias que lhe ocorriam e dizia para si próprio “Este poderá ser um bom conto ou, quem sabe, um livro.”
Quando se apaixonava era usual pegar na guitarra, quando só, e dobrava-se sobre ela, esperando que as notas que tocava fizessem música; ficava anos a trabalhar sobre uma música; a elevá-la ao ponto de a esquecer e, quando isso acontecia, ele sorria, porque não era mais a guitarra que o comandava – surgia o deleite de ouvir, só.
De quando em vez, havia odores que o faziam recuar a doces memórias; muitas delas eram já poeira, nevoeiro – mas, ainda assim, eram doces mistérios.
Os seus quadros eram como as músicas; na maioria, ficavam inacabados e com um odor a expectante terebintina.
Gostava de fazer nenhures; aquilo que se faz quando se faz nada, sim, porque fazer nada não é fácil e é bom. Costumava dizer que os melhores laivos de tempo são aqueles que não se sentem.
Gostava de cozinhar, a meia-luz; tratava com carinho cada pedaço de cebola. Adorava moinhos de pimenta – o objecto, o odor e o som dos grãos a serem quebrados.
Na fotografia, procurava captar aquilo que o olho não vê; a textura da pele de um pequeno insecto, aquilo que veríamos se os olhos estivessem nos nossos pés.
Dava-lhe muito prazer ter em casa muitos livros; um leque de opções que satisfizessem o súbito desejo de ler algo diferente.
Ia ao cinema para esquecer-se que estava dentro de um. Comovia-se com filmes simples. Comovia-se também com documentários sobre animais.
Ele passava os dias assim e, de cada vez que acontecia algo de mau, bebia água e telefonava a alguém que já não via a algum tempo e, assim, os dias passavam.
Não era maior que ele próprio; era exactamente do seu tamanho.
Foto de Dmitri Goutnik
Usava as mãos e os nós dos dedos para perceber que tipo de som saia do corrimão metálico ou da parede revestida a madeira; enquanto caminhava para outros afins e afãs.
Gostava de ajudar; especialmente com palavras. Não lhe era difícil usar as palavras. Frequentemente assentava ideias que lhe ocorriam e dizia para si próprio “Este poderá ser um bom conto ou, quem sabe, um livro.”
Quando se apaixonava era usual pegar na guitarra, quando só, e dobrava-se sobre ela, esperando que as notas que tocava fizessem música; ficava anos a trabalhar sobre uma música; a elevá-la ao ponto de a esquecer e, quando isso acontecia, ele sorria, porque não era mais a guitarra que o comandava – surgia o deleite de ouvir, só.
De quando em vez, havia odores que o faziam recuar a doces memórias; muitas delas eram já poeira, nevoeiro – mas, ainda assim, eram doces mistérios.
Os seus quadros eram como as músicas; na maioria, ficavam inacabados e com um odor a expectante terebintina.
Gostava de fazer nenhures; aquilo que se faz quando se faz nada, sim, porque fazer nada não é fácil e é bom. Costumava dizer que os melhores laivos de tempo são aqueles que não se sentem.
Gostava de cozinhar, a meia-luz; tratava com carinho cada pedaço de cebola. Adorava moinhos de pimenta – o objecto, o odor e o som dos grãos a serem quebrados.
Na fotografia, procurava captar aquilo que o olho não vê; a textura da pele de um pequeno insecto, aquilo que veríamos se os olhos estivessem nos nossos pés.
Dava-lhe muito prazer ter em casa muitos livros; um leque de opções que satisfizessem o súbito desejo de ler algo diferente.
Ia ao cinema para esquecer-se que estava dentro de um. Comovia-se com filmes simples. Comovia-se também com documentários sobre animais.
Ele passava os dias assim e, de cada vez que acontecia algo de mau, bebia água e telefonava a alguém que já não via a algum tempo e, assim, os dias passavam.
Não era maior que ele próprio; era exactamente do seu tamanho.
Foto de Dmitri Goutnik
2 Comentários:
Estava a ver que ninguém reparava!
A propósito, ando a pesquisar sobre a tua sugestão, o Craig Armstrong; até ao momento, pelo que tive oportunidade de ouvir, não consigo entender como é que nunca se porporcionou tomar conhecimento da sua existência até agora...gosto muito e quero mesmo ouvir mais.
Obrigado bee. ;-)
A esses já os conheço à distância! ;-)
Se gostas deles, como eu gosto, deves gostar também de "Mum", outros interessantes islandeses; conheces?
E, ao Criaig, junto o "Koln Concert" do Keith Jarret ou, não tanto pela musicalidade como pela afinidade conceptual, o "Imaginary Day" de Pat Metheny.
Boas audições!
A partilha é sempre um prazer :-)
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