Coisas do Amor - a história e o presente
I – Preâmbulo(s)
II - História(s) ao ouvido
Na Grécia Antiga (1300 a.C. – 27 d.C.) as mulheres foram tornadas de tal forma supérfluas socialmente (à excepção das prostitutas de alta classe), que a bissexualidade era uma constante. O amor duradouro era encarado como uma paixão[1] e, geralmente, não era sinónimo de casamento. Uma relação esporádica com um volátil amor era o normal; mais um divertimento quase filosófico do que outra qualquer coisa.
No Império Romano (27 d.C. – 385 d.C.) o desrespeito pelo amor e pelo sexo foi exponenciado; os abortos eram comuns e recém-nascidos eram abandonados frequentemente.
Os contornos lascivos da cultura amorosa românica foram atacados freneticamente com a ascensão do Cristianismo (385 d.C. – 1000 d.C.) e no prolongamento da Idade Média, onde toda a forma de prazer foi condenada dando lugar ao espírito de sacrifício, abnegação e auto-tortura; o sexo tornou-se um pecado e uma culpa; o amor tornou-se num mal necessário, tão necessário como pouco romântico. S. Jeremias estabeleceu que o homem que amar ardentemente a sua mulher, comete uma forma de adultério.
Antes e durante o Renascimento (1000 – 1700) os trovadores promoveram, semi-clandestinamente, o amor platónico, onde se acreditava que uma paixão insatisfeita melhorava a sensibilidade e o carácter pessoais[2]. Pela primeira vez, o amor encontrava-se associado a uma espécie de nobreza de carácter. Enquanto a Igreja fazia crer que a mulher feliz era uma bruxa, continuavam-se a fazer casamentos baseados em tudo menos no amor.
A nova classe (Nobreza), e, consequentemente o povo, começaram a associar o sexo ao amor. Shakespeare escreve Romeu e Julieta. No séc. XII nasce o conceito de que duas pessoas casadas devem viver numa casa familiar.
Com o nascimento do puritanismo, duas vertentes opostas (re)definiram-se: o ideal liberal de Martinho Lutero, seguido também por John Milton, onde o amor e prazer terrenos não constituíam nenhum pecado, antes pelo contrário; e o ideal Calvinista baseado na admiração de Deus e espiritualidade, em prol dos prazeres materiais. Para John Calvin, o casamento tinha duas funções: procriação e eliminar a incontinência.
No princípio do séc. XIII, Luís XIV estabeleceu regras de etiqueta que suprimiam qualquer manifestação de emoção, levando ao que se poderá chamar de sedução racional. Este comportamento foi um modelo europeu, não só para a aristocracia como também para o homem vulgar.
Com a idade das luzes veio o pensamento racional e, com este, as regras; se bem que os credos do Cristianismo tenham entrado em relativa decadência, continuavam a existir entraves sociais no domínio da expressão das emoções e, portanto, no domínio dos sentimentos[3].
III - Fogo que arde e que se vê
O Capitalismo abriu caminhos aos desfavorecidos de berço para enriquecerem. Estes novos-ricos copiavam a conduta das classes mais altas, mas viviam segundo os costumes das classes mais baixas; as elites sociais (antes, percursoras de referências de conduta) desdensificaram-se e o direito à criatividade sentimental generalizou-se.
Devido ao desejo que os self-made tinham em sobressair e protagonizar-se, nasce um espírito precisamente oposto ao racionalismo que teria sido a bitola emocional até a esta parte; em reacção, a sensibilidade impera como o nobilitante ideal da natureza humana. Os homens cresciam tímidos e procuravam as mulheres tímidas; um casamento era glorificante para a mulher, o que, a médio prazo, se viria a conotar como um status opressivo.
Jean Jacques Rousseau foi um dos grandes percursores europeus deste liberalismo sentimental[4] (e político), apelando à seriedade da classe média e ao valor da modéstia feminina. Chorar tornou-se chique.
O ideal romântico da mulher doce e frágil dominada pela força sensível do homem nasceu com a Revolução Industrial. (a ideia de subjugação da mulher ao homem persistiu)
Os novos sistemas de escolas públicas libertaram a mulher das suas funções domésticas tradicionais; o homem razoável podia agora trabalhar menos e dedicar-se mais à mulher como companheira conjugal[5]. O sexo, depois de séculos de trevas, começou a ser reexplorado como um prazer[6].
Em 1792, Mary Wallstonecraft ataca fortemente a subjugação das mulheres casadas e abre portas para o movimento feminista. Cem anos depois a mulher tinha direitos sufrágio e havia sido elaborada a primeira reforma do divórcio. A noção de amor livre nasce em finais do séc. XIII. A mulher encontrava-se emancipada.
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[1] Pathos – doença.
[2] O Don Quixote de la Mancha (1604) é um exemplo desta primeira forma de romantismo
[3] Foi no séc. XIII que se criou o mito de Don Juan; o amante de luxo, irrepreensivelmente falso. Giovanni Jacopo Casanova, entre as suas muitas aventuras amorosas, escrevia livros sobre matemática, história, astronomia e filosofia.
[4] O poeta irlandês Tom Moore descobriu inclusive sentimentos que tinha por pedras na estrada.
[5] If they are not company enough for each other, it is but a sad affair. Advice to a Young Man, Corbett.
[6] Em 1850, existiam à volta de 50 000 prostitutas a circular pelas ruas de Londres.
Smoke, Barbara Mensch.
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